Universidade
de Évora
Departamento
de Biologia
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Disciplina de
Virologia
Ano 2003/04
Prof. Carlos
Sinogas
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Vírus Ébola – Febre
Hemorrágica
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Ana Alberto nº 13719
Elsa Prates nº 16900
Soraia Vieira nº 15795
13 de Janeiro de 2004
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I. Definição
A. Classificação taxonómica
O vírus Ébola pertence ao género Filovírus,
família Filoviridae. O nome filovírus significa em latim filiforme, o que quer dizer
que são compridos e finos. O outro vírus deste género é o vírus Marburgo. Ambos causam febre e hemorragias, daí serem
considerados agentes de febres hemorrágicas. Apesar de ser comparado com as
famílias Rhabdoviros e Paramyxovirus,
a sua significância é diferente. Todas estas famílias partilham algumas
semelhanças ao nível genómico, o que faz com que estas pertençam à superfamília
Mononegavirales (Wagner et al., 2003).
Partilham ainda a presença de envelope lipídico,embora
não possuam a mesma forma.
A morfologia do vírus Ébola varia consoante a partícula viral de que se
trata, ou seja, é pleomórfica, (Ferreira & Sousa,
2002), o que significa que pode surgir com diferentes formas. Normalmente tem a
forma de “U” ou baciliforme, mas também pode apresentar-se de forma circular.
As partículas virais podem ter mais do que 14.000nm de comprimento e 80nm de
diâmetro. Este vírus possui uma nucleocapside
helicoidal estriada, a qual apresenta ainda um canal axial.
O virião é revestido por uma lipoproteína derivada da célula
hospedeira, esta membrana lipoproteica tem
alongamentos em forma de espinhos, com 7nm de comprimento (Wagner et al., 2003). O vírus
penetra nas células por ligação de uma glicoproteína, que existe na superfície
deste, a receptores membranares da célula. Uma vez
efectuada a ligação, o vírus penetra, com facilidade, na célula passando a
controlar o processo de tradução, obtendo desse modo, as estruturas necessárias
à sua proliferação.
Sem a protecção
proteica o vírus é inofensivo e não infeccioso. O genoma é constituído
por uma pequena cadeia de RNA negativa, linear e não
segmentada, rica em resíduos de adenosina e de uridina. Este genómico tem cerca de 19 Kb, donde são
codificadas sete proteínas: uma polimerase (Pol), uma
glicoproteína (G), uma nucleoproteína (NP), sendo as restantes quatro proteínas
estruturais (VP40, VP35, VP30 e VP24) e, apresentam-se, duma forma geral,
codificadas no genoma pela seguinte ordem:
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Figura 1 - Sequência genómica geral do vírus Ébola.
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Figura 2 – Sequência de proteínas traduzidas
pelo genoma do vírus..
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Existem três zonas
de sobreposição no seu genoma, que possuem em média 18bp
de comprimento. A primeira sobreposição é entre os genes da VP35
e da VP40, a segunda entre os genes da GP e da VP30 e a terceira entre
os genes da VP24 e o gene L. Estas sobreposições
estão limitadas às sequências conservadas, que são determinadas pelos sinais transcricionais, existindo três regiões não codificantes entre os genes da VP30
e da VP24.(site3)
A NP é a proteína da nucleocapside,
sendo o principal componente do revestimento proteico. Acredita-se que o gene
para a VP35 é a chave da virulência do Ébola, devido ao seu posicionamento no
genoma e ao seu tempo de transcrição, e ainda por parecer incluir uma região
reguladora.
Os estudos que têm sido realizados, mostram que a VP35 é um interferão do tipo I (INF) antagonista, que regula a sua
própria síntese. È para este interferão que o sistema
imunitário não possui uma resposta adaptativa, a qual seria uma forma mais
rápida e eficaz de controlar a infecção viral, do que através da resposta dos
anticorpos.
As funções exactas da VP24 e da VP40, ainda não foram descobertas na sua
totalidade, mas acredita-se que são componentes da membrana, devida à natureza
hidrofóbica dos seus aminoácidos. Acredita-se que a VP30 seja uma
nucleoproteína, porque está fosforilada e ligada a
outras nucleoproteínas. A GP é uma glicoproteína que é traduzida em duas
sequências diferentes (GP/sGP).
Uma cadeia completa de mRNA para GP
poderá derivar do gene e de um pequeno componente, sGP,
e este poderá derivar de um fragmento ribossomal
transformado numa ORF, como resultado do aparecimento de um codão stop a
meio da leitura do gene. A GP infiltra-se na membrana hospedeira antes das
partículas virais saírem da célula e o sGP
acredita-se que seja uma proteína extracelular. Ambas poderão estar envolvidas
no processo de activação do sistema imunitário do hospedeiro, ligando-se nos
receptores celulares deste e conseguindo entrar na célula.
O L é um gene que codifica a RNA polimerase e é importante na infecciosidade
do Ébola, pois a polimerase é a responsável pela
síntese de novas cadeias do genoma viral.
Depois do vírus
entrar na célula, através de uma mecanismo desconhecido, dá-se início ao
processo de replicação, que dura cerca de 8 horas. Sabe-se ainda muito pouco acerca dos seus detalhes, mas pode-se
assumir que este seja semelhante aos ciclos de replicação dos Rhabdovirus e Paramyxovirus. O
genoma RNA (-) é desenrolado e a L polimerase
sintetiza a cadeia antisense de mRNA
(+), que codifica as proteínas específicas do vírus (nesta altura o genoma
ainda não foi replicado na sua totalidade). Uma área do citoplasma da célula,
irá desenvolver proeminentes corpos de inclusão, que servirão de local de
suporte das proteínas estruturais do vírus. Acontece em simultâneo, a
replicação do genoma da progenia: a polimerase sintetiza uma cadeia completa, complementar à
cadeia molde de mRNA (+), sintetizando novas cadeias
de mRNA (-).
Fora do hospedeiro, o Ébola é considerado como um vírus frágil, pois a partícula
viral é sensível ao calor, ao pH ácido, radiação e a soluções hipocloríticas (Site5).
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Figura 3- Sequências
completas dos genomas do vírus Ébola Zaire (Site6)
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Figura 4- Sequências
completas dos genomas do vírus Ébola Reston (Site7)
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A principal
diferença entre os subtipos do vírus, parece residir no gene que codifica para
a glicoproteína, responsável pela entrada do vírus nas células. Há uma
tendência natural deste vírus para modificá-la com frequência, formando subtipos,
pois não tem capacidade de rever as suas cópias, o que leva à existência de delecções e alterações no genoma. No entanto, verifica-se o
contrário, pois o vírus Ébola
apresentam taxas de alteração ínfimas, o que poderá dever-se ao facto de
estar restrito a áreas geográficas limitadas, cujas pressões selectivas são
constantes (Site8), como
também ao curto período de tempo que se encontra dentro do hospedeiro.
B. Sintomatologia/ Patogénese
O Ébola tem um grau de patogenia de nível 4 (superior ao do
HIV que é de nível 2) e o período de incubação do vírus varia entre 2 a 21 dias. Os sinais dos primeiros sintomas
podem aparecer entre quatro a quarenta dias depois da exposição ao vírus. Os
estádios iniciais do Ébola HF, têm sido frequentemente confundidos com os de
outras doenças, como a Malária e Febre Amarela, pois
os sintomas não são específicos desta doença.
Os primeiros
sintomas começam com intensas dores de cabeça que serão frequentes ao longo do
desenvolvimento da infecção, acompanhado de mau estar, fadiga, dor de garganta,
dor de costas, vómitos, náuseas, diarreia, conjuntivite, artrites e até estado
de coma. Ainda nesta fase aparecem manchas vermelhas na face, o indica
tratar-se de um paciente hemorrágico. Após uma semana, o paciente desenvolve
uma efervescência hemorrágica, isto é, começa a sangrar das membranas mucosas,
tal como dos olhos, nariz, boca e ânus. O seu comportamento também se modifica,
passando a ser mais pacífico com períodos alternados de irritabilidade e falta
de memória acompanhadas de cegueira, dor no peito e depressão.
As transfusões de
sangue num paciente neste estado são difíceis de executar, pois o sangue não
consegue coagular o que torna difícil de parar a hemorragia.
A replicação
viral continua, assim como a febre hemorrágica, que simultaneamente se
desenvolve. O vírus vai destruindo o revestimento dos vasos sanguíneos, daí o
elevado sangramento. Já num estado avançado, o paciente começa a sangrar
violentamente através dos vómitos e diarreia caracterizando-se assim, como
vómito preto devido às manchas pretas que aparecem no sangue como causa do
progresso da doença, as vias intestinais são liquidificadas e eliminadas com o
sangue. E finalmente o paciente morre com a grande perda de volume de sangue
provocando um choque terminal.
As primeiras
células afectadas são as macrófagas e,
conseqüentemente dá-se a supressão da resposta imunitária. O vírus replica-se e
posteriormente ataca os tecidos epiteliais no sistema vascular, causando danos no
pericárdio e vasos sanguíneos. Os órgãos mais afectados são os rins, fígado e
os órgãos sexuais que acabam por ser destruídos, assim como os músculos e
ligamentos. O córtex é liquidificado e uma hemorragia inicial provoca a acção
dos factores coagulantes resultando na coagulação dos órgãos. Os tecidos ficam
isentos de sangue provocando a sua morte e liquidificação (Site9).
C. História e Prevalência
O primeiro filovírus foi isolado em 1967, quando um grupo de
trabalhadores de laboratório na Alemanha e na Jugoslávia,
desenvolveram febre hemorrágica, enquanto analisavam tecidos de macacos
pertencentes à espécie Cercopithecus aethiops, provenientes do Uganda e aparentemente
saudáveis (Ferreira & Sousa, 2002). Ocorreram 31 casos de doença e 7 mortes
associados a estes surtos. O vírus foi designado de Marburg,
Alemanha, de acordo com o local de ocorrência destes surtos epidémicos. (site1)
O outro vírus do
género Filovirus -
vírus Ébola, foi identificado pela primeira vez numa província da região
equatorial oeste do Sudão e numa região próxima do Zaire (actualmente República
Democrática do Congo) em 1976, após epidemias significativas no Yambuku, norte do Zaire, Nzara e
sul do Sudão (site 1). Estes surtos envolveram duas estirpes diferentes do
vírus Ébola, como ficou provado, designadas, tal como no caso do vírus Marburg, de acordo com a nação em que foram isoladas - estirpes Zaire e Sudão (site 1; Ferreira & Sousa,
2002). Ambas as formas dos vírus são altamente letais, uma vez que aproximadamente
90% dos casos do Zaire e cerca de 50% dos casos do Sudão resultaram em mortes:
das 284 pessoas infectadas no Sudão, entre Junho e Novembro de 1976, 117
resultaram em mortes, tendo ocorrido no Zaire 318 casos de infecção e 280
mortes, entre Setembro e Outubro do mesmo ano. Um caso isolado ocorreu no Zaire
em 1977 e um segundo surto epidémico no Sudão em 1979 (site 1).
Em 1989 e 1990,
uma nova estirpe do filovírus Ébola, o Ébola Reston (EBO-R), foi isolada em macacos mantidos em
quarentena, em laboratórios em Reston (Virginia),
Alice (Texas) e na Pensilvania. Estes macacos haviam
sido importados para os Estados Unidos da América (U.S.A.) das Filipinas, onde
em 1989, se registaram casos de infecção, numa zona de quarentena para macacos
pertencentes à espécie Macacca fascicularis. Destas infecções resultaram algumas
mortes entre os macacos e, pelo menos quatro casos de humanos infectados foram
registados, embora nenhum tenha sofrido de doença clínica grave (site 1).
No ano de 1995
uma larga epidemia ocorreu em Kikwit, no Zaire, com
315 casos, 244 dos quais tiveram morte (site 1; Dowell
et al., 1999).
Em 1994-95 um
caso humano de EHF e vários casos em chimpanzés foram confirmados na Costa do
Marfim, onde se isolou um novo subtipo do vírus – Ébola Costa do Marfim
(EBO-CI, EBO-Côte d’Ivoire, ou EBO - TAI) (site1; Formenty
et al., 1999).
No Gabão, a EHF
foi pela primeira vez documentada em 1994, tendo ocorrido surtos epidémicos
entre Fevereiro e Julho de 1996 (site 1). De acordo com a mesma fonte, não foram
relatados quaisquer outros casos de infecçãos pelo
vírus Ébola até à ocorrência de um novo surto em 2000, em Gulu,
no norte do Uganda.
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Figura 1 - Mapa de
localização de surtos do vírus Ébola no continente
africano
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II. Epidemiologia
A. Transmissão
Actualmente
sabe-se que o vírus Ébola é transmitido, na espécie
humana, pelo contacto directo com sangue, secreções, órgãos ou sémen de pessoas
infectadas. A transmissão através do sémen pode ocorrer várias semanas após a recuperação
clínica, como acontece com o vírus Marburg. A transmissão nosocomial (hospitalar) através do contacto com fluídos corporais infectados via percutânea,
pela reutilização de seringas, agulhas ou outro equipamento médico contaminado
com estes fluídos, foi também um importante factor de
transmissão da doença. No entanto, nos grandes
surtos a transmissão pessoa-a-pessoa é predominante e
o contacto físico com pessoas doentes, contribui com a maioria dos episódios de
contaminação - durante os surtos epidémicos no Sudão e
na RDC, este modo de transmissão terá contribuído com
taxas de reincidência (surtos secundários) de 10 a 20%, devido aos
muitos contactos entre doentes e seus membros familiares (Dowell
et al., 1999).
A investigação
dos casos que ocorreram entre os surtos epidémicos do Ébola
de 1976, no Zaire (RDC) e no Sudão e, o surto de 1995
no Kikwit (RDC), permitiu
retirar algumas conclusões acerca dos modos de transmissão, embora não tenha
permitido quantificar o risco independente de cada tipo de exposição associado
a actividades específicas, como partilhar refeições, contacto físico com os
doentes, contacto com fluídos corporais infectados,
práticas fúnebres ou dispersão pelo ar, uma vez que estas exposições ocorriam
muitas vezes em simultâneo (Dowell et al., 1999).
Os casos de infecção primária corresponderam aos indivíduos que tiveram o
contacto primário com o vírus, ou seja, os primeiros a serem infectados,
podendo ou não ser conhecida a fonte de infecção, enquanto que a infecção
secundária diz respeito aos indivíduos que foram infectados a partir dos
primeiros, através de contactos vários. De facto, na maioria das famílias
africanas eram os familiares das pessoas doentes, sobretudo os membros
femininos, os responsáveis por cuidar dos pacientes, quer em casa quer no
hospital, pelo que o contacto directo com a pessoa infectada,
terá sido o mais importante factor de risco para a transmissão secundária aos
membros da família (Dowell et
al., 1999).
O EBO tem sido recolhido em elevada concentração
a partir de urina e sangue de primatas não humanos, pelo que é esperado que
esteja igualmente presente em excreções e nos vómitos. Experiências com outros
agentes infecciosos, torna plausível este potencial modo de transmissão, por
analogia com outros patógenicos que se transmitem por
via fecal-oral, como é o caso de Shingella dysenteriae ou do vírus da hepatite A. Uma intrigante
explicação para o papel do contacto directo na transmissão é o facto de o vírus
ser excretado no suor, hipótese que é suportada por biópsias à pele de humanos,
obtidas durante o surto epidémico de Kikwit (1995),
que mostrou evidências de antigene para o vírus EBO, em várias estruturas
cutâneas incluindo glândulas do suor (Dowell et al., 1999).
A virémia em infecções experimentais em macacos rhesus com vírus EBO, cresce dramaticamente nos estadios
tardios da doença, atingindo concentrações de 106-107
partículas/mL de sangue. Esta elevada concentração
viral em doentes terminais, em conjunto com o aumento de diarreia e de vómitos
e hemorragias, provavelmente explica o aumento do risco para os membros
familiares expostos aos estadios tardios da doença (Dowell et al.,
1999).
No entanto, a exposição a pacientes em estadios precoces da doença não pode ser descurada. Este
aspecto tem importância em termos de saúde pública (medidas de controlo e
prevenção), uma vez que pessoas que apresentem um quadro de sintomas menos
marcado, podem constituir risco, por exemplo, como transmissores da doença.
Relativamente à
transmissão aérea, a ocorrência em 1989 de um surto em macacos, em Reston, Virginia, que não
partilhavam jaulas nem estavam nas mesmas divisões e que, ficaram infectados
com o subtipo Reston, levantou a hipótese da
transmissão por aerossóis, portanto aérea. Em laboratório estes vírus mostraram
alguma capacidade de infecção através de pequenas partículas aerossóis, em
macacos Rhesus, infectados experimentalmente, não tendo sido, no entanto, a
dispersão pelo ar, claramente demonstrada entre humanos. Nos surtos da DRC e do Sudão, foram registados poucos casos de infecção
sem exposição directa a outros casos, o que sugere que se existir transmissão
pelo ar entre humanos, esta terá tido um papel menor, se algum, nesses casos
ocorridos (Dowell et
al., 1999). Estes dados devem, pois, alertar-nos para a necessidade de
novas medidas de precaução, contra a possibilidade de contaminações aéreas em
futuros surtos epidémicos (Dowell et
al., 1999).
A transmissão do vírus Ébola aos humanos ocorre também pelo contacto com
chimpanzés, doentes ou mesmo mortos, como ficou documentado na Costa do Marfim
(Dowell et al.,
1999) e no Gabão (site1). Em Novembro de 1994, na Costa do Marfim, um novo
subtipo de EBO foi isolado de um paciente febril – uma investigadora que
estudava o comportamento de uma comunidade de chimpanzés livres, e que realizou
a autópsia de um deles, sem utilização das barreiras básicas de protecção –
bata, máscara e luvas de latex, pelo que terá sido
altamente provável que ela tenha sido contaminada pelo contacto como o sangue
do chimpanzé nas suas mãos ou, por salpicos no seu rosto. Este é assim, o
primeiro caso de EHF relatado na África Ocidental e o primeiro caso documentado
de infecção humana associada à infecção natural de primatas não humanos (Formenty et al., 1999).
A forma intermédia da doença causada pelo EBO-CI terá sido devida ao
subtipo do vírus em questão, ao modo de contaminação, à resposta biológica do
doente ou a uma combinação destes três factores. Apesar de as medidas de
controlo não terem sido sempre restritas e de não terem sido tomadas as devidas
precauções durante os testes de laboratório, nenhuns casos secundários
apareceram durante estes contactos, os quais incluiram
um homem que se alimentou do mesmo prato que a paciente, no dia 1 da doença e,
uma mulher que lhe prestou cuidados de saúde. Contudo, o facto de a cadeia de
transmissão, neste caso particular e uma vez mais, ser desconhecida, não
permite concluir grandemente acerca do risco para a população humana, desta
nova estirpe de EBO. Mas, reportando-nos à alta taxa de mortalidade entre chimpanés (25%), o subtipo EBO-CI, deverá ser considerado
como potencialmente patogénico em humanos (Formenty et al., 1999).
B. Propagação na População
As doenças
causadas por filovírus são zoonoses, na medida em que
são transmitidas para os humanos a partir de ciclos que se desenvolvem em
animais. Os primatas em cativeiro sofrem uma infecção tão grave como a dos
humanos e sabe-se que os macacos selvagens também não possuem anticorpos para o
vírus (Ferreira & Sousa, 2002).O reservatório
natural do vírus Ébola parece residir nas florestas de África e da Ásia, no
entanto, as suas origens permanecem indeterminadas, pelo que, diferentes
hipóteses têm sido sugeridas para explicar a origem dos surtos epidémicos do
Ébola.
· O facto de primatas não humanos terem sido
a fonte de infecção de humanos, não os permitiu considerar como reservatório,
uma vez que eles são infectados, tal como os humanos, directamente do
reservatório natural ou através de uma cadeia de transmissão a partir do
reservatório natural (site1).
· Assim, inicialmente suspeitou-se de
roedores, como no caso da febre de Lassa, cujo reservatório é um roedor
selvagem do género Mastomys. Uma outra
hipótese sugeria referia que
um vírus de uma planta podia ter causado a infecção em vertebrados. Por outro
lado, em laboratório demonstrou-se que, em morcegos experimentalmente
infectados com o vírus Ébola, este conseguia
replicar-se mas os animais não morriam. Este dado parece sugerir que certas
espécies de morcegos podem desempenhar um papel na manutenção destes agentes
infecciosos nas florestas tropicais, de onde são nativos, podendo mesmo
funcionar como vectores da doença (Ferreira & Sousa, 2002). Permanece, no
entanto, desconhecido o modo como o vírus é transmitido do reservatório natural
para os humanos, num surto ou em casos isolados.
Uma vez
infectado, a transmissão humano-humano é o meio pelo qual surgem as futuras
infecções. Mais especificamente, a transmissão envolve um contacto de perto
entre o indivíduo infectado ou os seus fluídos corporais e o outro indivíduo
são. Durante os surtos epidémicos de febre hemorrágica causada por filovírus, as pessoas que cuidaram (alimentaram, lavaram,
medicaram) ou que tenham trabalhado muito de perto com indivíduos infectados
estiveram em particulamente em risco de ficarem infectados.
(site1)
A mortalidade na
população humana causada pelos filovírus pode ser
superior a 90%(Ferreira & Sousa, 2002). O caso de
infecção reportado na Costa do Marfim (Formenty et al., 1999) mostrou a importância de um
único caso isolado, como ameaça à saúde pública – as travessias aéreas permitem
aos vírus viajar de um continente para outro em poucas horas. A epidemia
ocorrida em Kikwit, na RDC
em 1995, mostrou que o EBO e outros vírus letais podem matar pessoas durante
meses antes que o surto epidémico e o seu agente infeccioso possam ser
identificados. Assim e como recomendado pela WHO, é urgente que se melhore quer
a vigilância nacional quer a capacidade dos laboratórios dispersos pelo mundo,
para diagnosticar estas doenças emergentes (Formenty et al., 1999).
III. Diagnóstico
Trata-se de um
grupo de agentes altamente patogénicos para o Homem, sendo classificado como
agentes de risco do grupo IV (da classificação Europeia de agentes patogénicos)
(Ferreira & Sousa, 2002).
Diagnosticar o Ébola HF num indivíduo quando
este foi infectado recentemente, torna-se difícil uma vez que os primeiros
sintomas não são específicos desta doença e, por isso, frequentes. Mas se
alguém apresenta uma variedade de sintomas e há suspeitas de infecção com o
vírus do Ébola, deverão ser feitos os estudos
laboratoriais necessários o mais rapidamente possível. Deve então, ser feito um
exame ao sangue tal como é efectuado em caso de malária e, se o paciente também
apresentar diarreia juntamente com sangue, é necessário providenciar uma
cultura de fezes para posterior análise. Durante a virémia,
o diagnóstico pode ser feito pela observação de partículas virais ao
microscópio electrónico, a partir dos fluídos biológicos.O método de diagnóstico mais fácil e mais
utilizado tem sido a imunoflorescência indirecta,
para detectar o vírus em tecidos infectados ou anticorpos antifilovírus,
radiação gama (Ferreira & Sousa, 2002).
Os métodos que
poderão ser utilizados para a diagnose do Ébola HF que apresente alguns dias de sintomas, são o PCR (polymerase chain reaction) para detectar o RNA
viral, isolamento de vírus, ELISA (antigen-capture enzime-linked immunosorbent assay) para detectar o antigene
específico e material biológico suspeito e, IgG
ELISA. Já num caso mais avançado, poderão ser utilizados testes para anticorpos
IgM e IgG e, poderá também
ser diagnosticada retrospectivamente em doentes já falecidos usando testes imunohistoquímicos de material, formalizado, fixado e
tratado pela parafina, tem sido igualmente outro método usado na pesquisa do
antigénio viral, isolamento de vírus ou PCR (Ferreira & Sousa, 2002).
A recuperação total poderá levar um mês ou mais e os doentes terão perdido
peso, tido amnésia e estado acamados durante
este período. Contudo, a recuperação não significa que o paciente estará
totalmente curado e, sem capacidade de contagiar outros (site 2).
IV. Tratamento e Prevenção
Durante os surtos
epidémicos o isolamento de pacientes e o uso de roupas protectoras e o emprego
dos procedimentos de desinfecção, designados em conjunto, por precauções da
febre hemorrágica viral (VHF) ou barreiras de enfermagem, têm vindo a ser suficientes
para interromper transmissões posteriores dos vírus Marburg
e Ébola e, assim, controlar o fim dos surtos. Devido
ao facto de não existir ainda um tratamento efectivo das febres hemorrágicas
causadas pelos filovírus, a prevenção da transmissão,
pela aplicação das medidas de prevenção e de isolamento das VHF, é
correntemente a peça
central do controlo dos filovírus (site
2).
O único
tratamento possível é o sintomático, contudo, ultimamente tem-se procurado
evitar este método por se ter encontrado um elevado número de humanos e de
símios reagindo positivamente sem que, no entanto, aprese ntem
sinais ou sintomas da doença.Tem sido ensaiada a ribavirina
e o interferão humano sem resultados positivos.
Plasma humano de convalescente foi também aplicado, no entanto sem grande
sucesso (Ferreira & Sousa, 2002).
Os
grandes surtos humanos terminaram abruptamente, coincidentemente com a
implantação das medidas de controlo, como o uso de luvas durante o contacto com
os pacientes e os cadáveres. Por outro lado, quando é minimizado o contacto
entre pessoas infectadas e não infectadas, o número de novas infecções em
humanos, geralmente decresce. O facto de as barreiras terem revelado eficácia
na prevenção da doença, demostra o papel dos fluídos corporais e do contacto
físico na manutenção da transmissão, pelo menos no ambiente hospitalar (Dowell et al.,
1999). Noutros surtos epidémicos que ocorram em países mais desenvolvidos, ou
em que as práticas universais de precaução hospitalar sejam cuidadosamente
respeitadas, a quantificação do risco e dos modos de transmissão predominantes
na doença, serão diferentes dos encontrados no surto epidémico do Kikwit em 1995. Esta observações
implica que o uso de barreira de precaução pelos membros familiares e as
medidas universais standard dos hospitais poderiam ter prevenido a maioria das
infecções e de mortes por EHF no Kikwit (Dowell et al.,
1999).
Não existe um
tratamento modelo para o Ébola HF. Actualmente, os
pacientes recebem um tratamento geral, o qual consiste na estabilização dos fluídos e electrólitos dos mesmos, mantendo a oxigenação e
a pressão sanguínea e, tratando-os para qualquer implicação infecciosa que,
eventualmente, possa surgir. No entanto, as actuais terapias químicas têm pouco
ou nenhum efeito na paragem da doença. A coagulação vascular, choques, edemas
cerebrais, falhas nos rins e hipertensão, criam vários problemas a este
tratamento. Mesmo em testes efectuados em laboratório, a imunização não tem
sido bem sucedida e, a inoculação em testes animais com proteínas virais ou
vírus inactivos, não tem sido capaz de estimular o sistema imunitário para a
protecção contra o vírus.
Durante o surto
em Kikwit, 8 pacientes receberam sangue de indivíduos
que já tinham estado infectados e que recuperaram. Curiosamente, 7 dos 8
pacientes sobreviveram. Contudo, a eficácia do tratamento permanece
desconhecida, o que poderá dever-se à dimensão do estudo efectuado, uma vez que
foi reduzida, devido às características dos doentes, pois eram relativamente
novos e, por isso, este estudo não foi conclusivo.
Em 1996, os
cientistas iniciaram experiências com esteróides como uma possível ajuda para a
recuperação de doentes com Ébola HF. Utilizaram o desenvolvimento de antisoros que retiraram a
partir de cavalos e conseguiram testes positivos em babuínos. Anticorpos monoclonais a partir da medula e antisoros
de sobreviventes do Ébola parecem trazer alguma expectativa.
A. Prevenção - Controlo
Actualmente não existe
ainda vacina para esta doença. O desconhecimento acerca da epidemiologia e,
como tal, da história natural da doença, faz com que seja recomendado o
isolamento absoluto do doente (Ferreira & Sousa, 2002). As precauções
universais e as barreiras de enfermagem são efectivas na prevenção de infecções
cruzadas (Formenty et al.,
1999).
Extensos estudos ecológicos estão a ser desenvolvidos na região da Costa do
Marfim, para identificar o reservatório do vírus Ébola, do mesmo modo que estão
em curso outros estudos para identificar o reservatório do vírus Marburg, na República Democrática do Congo (site 1).
Em África, ainda é reduzido o número de medidas primárias de prevenção
estabelecidas, pois a identidade e a localização do reservatório natural do
vírus do Ébola permanecem desconhecidos. Se aparecem casos de doença declarada,
as condições sociais e económicas correntes favorecem a propagação de uma
epidemia. Por isso, os responsáveis pelos cuidados de saúde, devem esta aptos a reconhecer um caso de Ébola HF. Devem também
ter a capacidade de elaborar testes diagnósticos e estar prontos a colocar em
prática as devidas precauções, como técnicas de isolamento da febre hemorrágica
viral e o impedimento de contágio. Estas técnicas incluem a utilização de
vestuário de protecção, tal como máscaras, luvas, batas e outros; a utilização
de medidas de controlo de infecções, incluindo equipamento completo de
esterilização; e o isolamento de pacientes com Ébola HF do contacto com pessoas
não protegidas. O objectivo de todas estas técnicas é evitar o contacto das
pessoas com o sangue e as secreções dos pacientes e se um doente morre, é
igualmente importante que o contacto directo com o cadáver esteja protegido
(site 2).
Uma vez que o modo primário de transmissão
humano-humano consiste no contacto com sangue, secreções ou fluídos corporais
contaminados, qualquer pessoa que tenha tido contacto físico com os pacientes
deve ser mantido em estreita vigilância, ou seja, a temperatura corporal deve
ser observada duas vezes por dia, com imediata hospitalização e isolamento para
temperaturas acima dos 38.3ºC. Os contactos casuais devem ser assim, postos em
alerta pelo controlo da temperatura. A vigilância dos casos suspeitos deve
continuar durante 3 semanas depois da data do último contacto. O pessoal
hospitalar que tenha contactado de perto com pacientes ou materiais
contaminados, sem barreira de protecção de enfermagem, deve ser considerado
exposto a infecção e colocado sob vigilância (site 2).
Em 1976 durante a
epidemia no Zaire (RDC), todos os casos de infecção
pelo vírus Ébola, cuja contaminação ocorreu por
seringas e agulhas, morreram, tendo correspondido o encerramento do hospital de
Yambuku, no Zaire, à mais importante medida de
controlo do surto (Dowell et
al., 1999).
V. Curiosidades - Direcções Futuras
As crianças foram
relativamente poupadas no surto epidémico do Kikwit,
como ocorreu tipicamente nos anteriores surtos de EBO e de outras febres hemorragicas virais. Apenas 9% das pessoas que desenvolveram
EHF no Kikwit, tinha idades inferiores a 17 anos e,
relativamente a estes, os membros familiares adultos que contactavam com os
doentes, estavam em risco adicional. Assim, parece possível que em adição ao
facto de estarem menos expostas ao EBO, as crianças sejam menos susceptíveis de
contrairem infecção ou doença severa. Este é um
aspecto que necessita de investigação futura (Dowell et al., 1999).
Os cientistas
deparam-se com a grande dificuldade de encontrar o vector viral, porque a
húmida floresta africana compreende uma alta diversificação de formas de vida.
Este seria o grande passo que permitiria encontrar a cura e prevenir a
infecção.
Tem-se verificado que na região de Mt. Elgon, a qual se situa entre o Uganda e o Quénia, 2% a 7%
da população tem anticorpos para o Ébola. Da população de outros primatas, 10%
também tem anticorpos, o que significa que nesta região existe um alto nível de
exposição ao vírus.
Opostamente ao HIV, ou outro vírus de RNA, o Ébola tem mostrado ter uma baixa taxa de mutações e
de deriva genética, pois apresenta sequências genéticas altamente conservadas,
o que poderá ser importante na pesquisa de vacinas e de medicamentos.
No passado, a letalidade do vírus impedia a
pesquisa em qualquer outro ambiente que não o de Protecção de Nível 4. Com os
avanços da tecnologia em DNA recombinante,
as proteínas podem agora ser sintetizadas a partir de culturas bacterianas e
estudadas sem perigo de infecção.
Apesar de todas as dificuldades encontradas
na pesquisa de uma cura ou de uma vacina, alguns avanços têm sido feitos, no
entanto, faltam estudos mais eficazes e conclusivos.
I. Referências Bibliográficas
Dowell, S.F.; Rose Mukunu;
Thomas G. Ksiazek; Ali S. Khan; Pierre E. Rollin
& C.J. Peters (1999). Transmission of Ébola
Hemorragic Fever: a Study of Risk Factors in Family
Members, Kikwit , Democratic
Republic of the Congo , 1995. The
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(suppl): S87-91.
Ferreira, W.F.C. & J.C.F. de Sousa (2002). Microbiologia
3. Volume 3. Lidel. 466 pp.
Fomenty, P.; Christophe Hatz; Bernard Le Guenno; Agnés Stoll; Philipp Rogenmoser & Andreas Widmer
(1999). Human Infection Due to Ébola Vírus, Subtype Côte d’Ivoire : Clinical an Biologic Presentation. The Journal of Infectious
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Wagner, E. K. &M.J. Hewlett (2003). BASIC VIROLOGY, 2nd ed. Blackwell Science Inc. Massachusetts , USA .
Site 4: The Ebola virus VP35
protein functions as a type I IFN antagonist. Proc. Natl.
Acad. Science. USA http://www.pnas.org/cgi/content/full/220398297v1
Site 5 : http://www.bio.davidson.edu/Courses/Immunology/Students/spring2000/haines/restricted/ebola.html
Site 9 : Institute for Molecular Virology, Marburg and Ebola Viruses.
http://www.bocklabs.wisc.edu/eov-ebola.html
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